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quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Um Saloio na Andaluzia

O texto é um bocado longo ( e ainda eu lhe suprimi as duas primeiras partes ) e reporta-se a Fevereiro de 2007, quando, mesmo sem companhia, decidi ir à Maratona de Sevilha. Em cima da hora lá arranjei um amigo, o Fernando Alves, que era para ter ido com o pessoal de Grândola, com quem tinha também a estadia já marcada,  mas, como mora aqui pertinho, acabou por ir comigo, embora tivéssemos ido juntos até Sevilha. Mas depois, andei por lá sozinho pois era o único que não tinha alojamento reservado. Fui ficar precisamente no mesmo local onde tinha ficado em 1995. 
Foi publicado no Forum do Mundo da Corrida. 

Acordei logo que o telemóvel me deu o sinal. Eram 6,30. Banho, preparo a tralha, pequeno almoço (que levava comigo, pois claro) e… ala ! Queria chegar a horas.
O carro lá estava à minha espera. Inicio a viagem de acordo com o “plano” feito na véspera . De repente : - “porra que já me enganei!” mas fui avançando, convencido que naquela direcção, havia de chegar ao rio e voltava a orientar-me a partir dali.

Vejo um sujeito a caminhar, de fato de treino e mochila às costas e pensei : -“Porreiro, vou perguntar-lhe se vai para o Estádio Olímpico, dou-lhe boleia e ele ensina-me o caminho”: (… e agora peço desculpa pelas “bacoradas”, pois isto não é língua que se apresente em lado nenhum )
- Buenos dias (ainda era noite) ! Vai para el Estádio Olímpico ?
Disse-me que sim, sorriu e enquanto entrava no carro disse-me:
- Je ne suis pás espagnol !
- Ah bom. Moi também non . Je suis portuguais.
- Je sais, je sais . Vous êtes três gentil.
- Non. C’est pas bien! Vou savez où est le Estádio Olimpique ?
- Oui, oui. La bas, a droite!
- Oh, merci. (Pudera, tínhamos chegado, precisamente ao rio. Fiquei a pensar cá para comigo, que o meu francês andava mesmo pelas ruas da amargura e o homem até era simpático mas, tanto ele como eu, tínhamos alguma dificuldade em comunicar. Entrei naquela de… pensar a frase e depois ver se conseguia traduzi-la e então perguntei-lhe) – Vous connaissez bien cette maratone ?
-Oui, mais cette anée j’ai pas fair l’entreinement necessaire.
-Mois aussi. Je pense faire trois heures et demie .
-Ah, bom . C’est très vite pour moi. Plus de 4h !
(depois pensei em dizer que já cá tinha vindo muitas vezes, mas achei melhor não para que ele não pensasse :- “bolas! veio cá tanta vez e ainda não aprendeu o caminho para o Estádio Olímpico!? )
Falámos depois na Maratona de Paris e ele achou que tinha gente de mais para que a Prova pudesse ter mais qualidade. E depois diz-me ele :
-Moi, j’organize une Marathon en France!
-Et comment s’apelle ?
-La Marathon du Mèdoc!
-Ah oui? J’ai des amis que on fait cette maraton et ont aimé beucoup. J’ai vu beaucoup de publicitée . Au Marathon de Madrid il y avait beaucoup de “palhaces”…
- Des guisés! – corrigiu ele, entendendo-me, e continuou : - je suis un guisé ! Au Mèdoc il y a 8000 courreurs et 6000 sont des guisés!
-8000?
-Nous ne pouvons pas acepter plus de maratoniens parce que les routes sont três etroites.
- Quelque jour j’irais courrir la Marathon du Mèdoc.
-Quand vou voulez .

Estávamos no Estádio Olímpico. Estacionei e fomos ao guarda roupa para deixar o saco. Ficámos, por ali mais um bocado e sempre ia aparecendo um ou outro conhecido.
Gostava muito de saber mais sobre Medoc, logo, assunto haveria com fartura para estarmos ali um bocado na conversa, mas o meu francês é que anda bem pior do que eu pensava, pelo que me despedi do meu recente amigo com um “bonne chance” que ele, simpaticamente retribuiu e cada um foi à sua vida.






Nada como ir cedinho para as provas! Temos tempo para tudo, inclusive andar ali de um lado para o outro a ver se encontramos malta conhecida.
Faltavam 20 minutos para a hora da partida, quando entro no estádio. Uma menina simpática dá-me uma garra da água para ir bebendo, pois é sabida a importância de ter o organismo suficientemente hidratado, antes, durante e após o esforço. Bebendo aos poucos e corricando, ao som de música ambiente, SEM NERVOS, aguardei pelo sinal da partida enquanto assistia, com uma certa tristeza, à transformação das faixas laterais da pista, em mictórios, onde às dezenas, “aliviaram a bexiga”, quando dispunham de locais adequados e em quantidade para o fazer, sem necessidade de usar a “selvajaria”. Enfim...servirá de algum consolo, constatar que não é só em Portugal que estes actos se praticam.

9 horas! Soa o tiro e o speacker, incutindo entusiasmo naquilo que dizia ( e que eu não entendia patavina ) não deixava de nos causar alguma emoção. No ecran do estádio eram transmitidas aquelas imagens impressionantes do “esticar” do pelotão rumo ao túnel sul, por onde se iria iniciar a “visita” à cidade. A temperatura estava agradável ( 16 -18 º). Não havia ameaças de chuva, não estava vento e o céu estava encoberto q.b. para não deixar “passar” muiro calor.

Desta vez o percurso era ligeiramente diferente (não sei se já o disse) pois retirava os atletas do centro histórico, incluindo, em compensação, a passagem, tanto na ida como na vinda, a passagem pelo Parque de Alamilo que confina a nascente com o Estádio.

A táctica estava estudada : Conter o entusiasmo, para não passar à meia antes da 1,43. Logo, teria de “aguentar os cavalos” a 4,50 / 4,55 . Quando estava a aproximar-me, vi que ia conseguir cumprir aquele objectivo. Só fiquei “chateado” foi porque a “margem de folgadura” que eu devia ter como resultado de uma certa contenção, para aplicar na 2ª parte, cadê ela ? Conclusão : aquela frase que tanta força psicológica nos dá à passagem da meia : “acabou o aquecimento, agora é que vai começar a Prova”, eu ainda a disse. Mas a convicção não era nenhuma! O moral foi um bocadinho abaixo e, por volta dos 23 Km, resolvi “remediar” com um power gel! Passa um grupo de cerca de 30 atletas à “boleia” do marca-passo das 3,30 ! Consegui ir com eles 2 Km, mas comecei a ver que o melhor era não arriscar.

Depois sou “bombardeado” por aqueles pensamentos, tipo “- que necessidade tenho eu, de fazer quatrocentos e tal Kms para vir para aqui cansar-me desta maneira? “ ou “ Já tenho idade para ter juizo e venho meter-me nestas alhadas”.

Ânimo, ânimo, diziam do público, vendo que a coisa não me estava a correr bem. Passava pela marca dos Km, olhava para o relógio, mas não me lembrava do tempo que levava no anterior. Por outras palavras, já não sabia a quantas andava e como sabia que ia lento, o esquecimento até era uma defesa contra a decepção. Fiz um esforço de memorização entre os 25 e os 26Km. Estava a andar a 5,30 ! Vá lá, vá lá, pensei que fosse pior !

Passa o “centurião” romano, com o seu elmo, espada e escudo e que merecia sempre a atenção do público. Gabo-lhe a pachorra.

Aos 32Km vai outro power gel ! Daqui para a frente, porque comecei a ganhar posições, comecei a ter a sensação que o pior já tinha passado. Estabilizo o andamento a 5m/km sem notar esforço. Passo depois, por muitos que me tinham passado (incluindo o romano) e mantive-me em crescendo até ao final. O balão das 3,30 é que ganhou vantagem demais pelo que nem ao longe eu consegui voltar a vê-lo.

Depois... foi aquela saborosa entrada no estádio, o cortar a meta (3,33 T.real) o colocarem-me uma toalha por cima das costas, o tirarem-me o chip, o alambazar-me com quartos de laranja, a medalha ao pescoço, o caminhar até ao guarda roupa , a banhoca .

Fora dos balneário, a descansarem junto a um pilar, lá estava o pessoal de Grândola (Vitor, Mário, Vieira, Sobral, Zé, Flaviano –peço desculpa aos outros cujo nome não me lembro). E que tempos eles fizeram !? Sim senhor, não brincam em serviço. E o Fernando Alves ? Com 2,45 foi “só” o melhor português !

Estava terminada mais uma. A satisfação por isso, era boa!
Pensámos em não ir à “Clausura” e iniciar rápido, a viagem de regresso, para virmos nas calmas. Despedimo-nos da malta e... ala. Eram 14h e começava a cair uma chuva miudinha.


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